PRIVILÉGIOS DOS FILHOS DE DEUS

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A Oração do Vencedor

João 17

Muitos estudiosos que procuram conciliar os relatos dos quatro Evangelhos acreditam que Jesus fez a oração registrada em João 17 ainda no cenáculo, quando terminou de instruir os discípulos. Em seguida, ele e os discípulos cantaram os salmos tradicionais da Páscoa, saíram do cenáculo e se dirigiram para o jardim do Getsêmani, onde Jesus costumava reunir-se com eles e orar (ver Mt 36:30-46 e Mc 14:26-42).

Quer tenha feito essa oração no cenáculo, quer a caminho do jardim, uma coisa é certa: trata-se da oração mais magnífica feita aqui na Terra e registrada em todas as Escrituras. João 17 é, sem dúvida alguma, o “Santo dos santos” do registro dos Evangelhos, e devemos abordar este capítulo com espírito de humildade e de adoração. Que privilégio enorme ouvir Deus, o Filho, conversar com o Pai quando está prestes a dar a vida como resgate pelos pecadores!

 Apesar de tudo o que ocorreu posteriormente naquela noite, esta oração deixa claro que Jesus foi e é o Vencedor. Não foi uma “vítima”; ele foi e continua sendo o Vitorioso. Encorajou seus discípulos dizendo: “Tende bom ânimo; eu venci o mundo” (Jo 16:33). A palavra mundo é usada dezenove vezes nesta oração, de modo que é fácil ver como se encontra relacionada a João 16:33. Se compreendermos e aplicarmos as verdades reveladas nesta oração profunda, ela permitirá que também sejamos vencedores.

 Não é difícil observar a progressão do raciocínio nesta oração. Em primeiro lugar, Jesus ora por si mesmo e diz ao Pai que concluiu sua obra aqui na Terra (Jo 17:1-5). 18 Em seguida, ora por seus discípulos, pedindo ao Pai que os guarde e santifique (Jo 1 7:6­ 19). Termina orando por nós e pela Igreja toda, para que possamos ser unidos nele e para que, um dia, participemos de sua glória (Jo 1 7:20-26).

Por que Jesus fez essa oração? Sem dúvida, se preparava para os sofrimentos que se encontravam diante dele. Ao contemplar a glória que o Pai lhe prometeu, deve ter recebido forças para seu sacrifício (Hb 12:1­ 3). No entanto, Jesus também pensava em seus discípulos (Jo 17:13). Essa oração deveria ter sido um grande estímulo para eles. Jesus orou pela segurança, pela alegria, pela união e pela glória futura de seus discípulos. Também orou por nós, para que soubéssemos de tudo o que fez por nós, tudo o que nos deu e tudo o que fará por nós quando chegarmos ao céu.

Nesta oração, Jesus declara quatro privilégios maravilhosos que temos como filhos de Deus, privilégios estes que contribuem para nos tornarmos vencedores.

1 . COMPARTILHAMOS DE SUA VIDA (Jo 17:1-5) Jesus começou orando por si mesmo, mas, ao fazê-lo, também orava por nós. “Uma oração por si mesmo não é, necessariamente, uma oração egoísta”, escreveu R. A. Torrey, e um estudo das orações da Bíblia mostra que isso é verdade. A prioridade de Jesus era a glória de Deus, e essa glória seria concretizada em sua obra consumada na cruz. O servo de Deus tem todo o direito de lhe pedir a ajuda de que necessita para glorificar seu nome. “Santificado seja o teu nome” é o primeiro pedido da oração do Pai Nosso (Mt 6:9) e a primeira tônica dessa oração.

As palavras “Pai, é chegada a hora” lembram as muitas vezes que o Evangelho de João menciona “a hora”, começando por João 2:4. Enquanto estava aqui na Terra, Jesus viveu de acordo com um “cronograma divino” e sabia que estava dentro da vontade do Pai. “Nas tuas mãos, estão os meus dias” (SI 31:15).

 Glória também é uma palavra importante na oração sacerdotal, aparecendo cinco vezes nestes versículos. Devemos fazer uma distinção cuidadosa entre as diversas “glórias” sobre as quais Jesus fala. Em João 17:5, se refere a sua glória preencarnada, quando estava junto do Pai, a glória que colocou de lado quando veio à Terra para nascer, servir, sofrer e morrer. Em João 1 7:4, relata ao Pai sua vida e seu ministério na Terra e lhe dá glória, pois ele (Jesus) concluiu a tarefa da qual o Pai o havia incumbido. Em João 17:1 e 5, Jesus pede que sua glória preencarnada lhe seja restituída, de modo que o Filho glorifique o Pai ao voltar para o céu.

 O termo glória é usado oito vezes na oração toda, de modo que constitui um tema relevante. Por certo, Jesus glorificou o Pai em seus milagres (Jo 2:11; 11:40), mas o Pai foi ainda mais glorificado por meio dos sofrimentos e da morte do Filho (ver Jo 12:23­ 25; 13:31, 32). De nosso ponto de vista, o Calvário foi uma demonstração repulsiva do pecado humano; mas do ponto de vista de Deus, a cruz revelou e magnificou a graça e a glória de Deus. Jesus anteviu sua volta ao céu quando disse: “[Consumei] a obra que me confiaste para fazer” (Jo 1 7;4). Essa obra incluía suas mensagens e milagres na Terra (Jo 5:17-19), a preparação dos discípulos para seu futuro ministério e, acima de tudo, o sacrifício na cruz (Hb 9:24-28; 10:11-18).

É com base nessa “obra consumada” que nós, como cristãos, recebemos a dádiva da vida eterna (Jo 1 7:2, 3). O verbo dar e suas conjugações aparecem nesta oração pelo menos dezessete vezes. Em sete ocasiões, Jesus afirma que os cristãos são dádivas do Pai para o Filho (Jo 17:2, 6, 9, 11, 12, 24). Estamos acostumados a pensar no Filho como uma dádiva de amor do Pai para nós (Jo 3:16), mas Jesus afirma que os cristãos são a “dádiva de amor” do Pai para o Filho querido!

 “A vida eterna” é um tema importante do Evangelho de João, sendo mencionada dezessete vezes. É uma dádiva gratuita de Deus para os que crêem em seu Filho (Jo 3:15, 16, 36; 6:47; 10:28). O Pai deu ao Filho a autoridade de conceder vida eterna aos que o Pai entregou ao Filho. Do ponto de vista humano, recebemos a dádiva da vida eterna quando cremos em Jesus Cristo. Mas, do ponto de vista divino, já fomos entregues ao Filho na eleição divina eterna. Trata-se de um mistério que a mente humana não é capaz de entender nem explicar; resta-nos, portanto, aceitá-lo pela fé.

 O que é a “vida eterna”? É conhecer a Deus pessoalmente. Não apenas saber coisas sobre ele, mas ter um relacionamento pessoal com ele pela fé em Jesus Cristo. Não podemos conhecer o Pai sem o Filho (Jo 14:6­ 11). Não basta simplesmente “crer em Deus”; em hipótese alguma essa convicção é capaz de salvar uma alma da condenação eterna. “Até os demônios crêem e tremem” (Tg 2:19). A discussão de Jesus com os líderes judeus (Jo 8:12ss) deixa claro que as pessoas podem ser sinceramente religiosas e, ainda assim, não conhecer a Deus. A vida eterna não é algo merecido pelo próprio caráter ou conduta; é uma dádiva que recebe quem reconhece que é pecador, arrepende-se e crê única e exclusivamente em Jesus Cristo.

 O Pai atendeu ao pedido de seu Filho e lhe deu glória. Hoje, no céu, há um Homem glorificado, o Deus Homem, Jesus Cristo! Pelo fato de ele ter sido glorificado no céu, os pecadores podem ser salvos na Terra. Todo o que crer em Jesus Cristo receberá a dádiva da vida eterna.

 Uma vez que compartilhamos de sua vida, somos vencedores, pois também participamos de sua vitória! “Porque todo o que é nascido de Deus vence o mundo; e esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé” (1 Jo 5:4). Nosso primeiro nascimento foi “em Adão” e nascemos derrotados. Em nosso novo nascimento pela fé em Cristo, nascemos vencedores.

Satanás tentou encobrir a verdade preciosa da obra consumada de Jesus Cristo, pois sabe que é o fundamento da vitória espiritual. “Eles, pois, o venceram [Satanás] por causa do sangue do Cordeiro” (Ap 12:11). Não devemos permitir que Satanás tire de nós o poder de vencer pela obra consumada de Cristo.

2 . CONHECEMOS SEU NOME ( jo 1 7 :6 -1 2 ) Cristo deu aos seus a vida eterna (Jo 1 7:2), mas também lhes deu a revelação do nome do Pai (Jo 17:6). No Antigo Testamento hebraico, Deus é chamado de “Jeová”, o grande eu sou (Êx 3:11-14). Jesus tomou o nome sagrado, “Eu Sou”, e o transformou em uma designação expressiva para seus discípulos: “eu sou o pão da vida” (Jo 6:35); “Eu sou a luz do mundo” (Jo 8:12); “Eu sou o bom pastor” (Jo 10:11), etc. Em outras palavras, Jesus revelou o nome do Pai ao mostrar a seus discípulos que ele era tudo de que precisavam.

 Mas o nome do Pai é ainda mais abrangente, pois Jesus também ensinou aos discípulos que Deus – o grande Eu Sou – era seu Pai celestial. O termo Pai é usado 44 vezes em João 13al7e106 vezes no Evangelho de João! Em suas mensagens para os judeus, deixou claro que o Pai o havia enviado, que ele era igual ao Pai e que suas palavras e obras eram provenientes do Pai. Foram declarações inequívocas de sua divindade, mas se recusaram a crer.

Na Bíblia, o “nome” refere-se à “natureza”, pois muitas vezes os nomes são dados para revelar algo especial sobre a natureza da pessoa que recebe a designação. Jacó era dado a intrigas, e seu nome vem do radical hebraico que significa “pegar pelo calcanhar”, isto é, fazer tropeçar, enganar (Gn 25:26). O nome Isaque quer dizer “riso” (Gn 21:6), pois o menino trouxe alegria a Abraão e a Sara. Até mesmo o nome de Jesus revela que ele é o Salvador (Mt 1:21).

 A declaração: “manifestei o teu nome” significa “revelei a natureza de Deus”. Um dos ministérios do Filho era revelar o Pai (Jo 1:18). O termo grego traduzido por “manifestar” significa “desdobrar, conduzir, mostrar o caminho”. Jesus não revelou o Pai instantaneamente, em um esplendor de glória, pois seus discípulos não poderiam ter suportado tal experiência. Aos poucos, por meio de suas palavras e atos, ele lhes revelou a natureza de Deus, à medida que se mostraram capazes de assimilá-la (Jo 16:12).

 A ênfase desta seção é sobre a segurança do cristão; Deus guarda os seus (Jo 17:11-12). Nossa segurança depende da natureza de Deus, não de nosso próprio caráter ou conduta. Quando estava na Terra, Jesus guardou seus discípulos, que podiam depender dele. “Guardava-os no teu nome” (Jo 1 7:12). Se o Salvador, limitado num corpo humano, foi capaz de guardar os seus enquanto estava aqui na Terra, acaso não poderia guardá-los agora que se encontra glorificado no céu? O Filho e o Pai, com o Espírito Santo, certamente são capazes de guardar e de proteger o povo de Deus!

 Além disso, o povo de Deus é a dádiva do Pai para seu Filho. Acaso o Pai daria ao Filho um presente que não fosse duradouro? Os discípulos haviam pertencido ao Pai pela criação e pela aliança (pois eram judeus), mas agora pertenciam ao Filho. Somos extremamente preciosos a seus olhos! Ele cuida de nós e, neste exato momento, está orando por nós! Sempre que nos sentirmos abandonados pelo Senhor ou que pensarmos que seu amor está distante, podemos ler Romanos 8:28-39 e nos regozijar!

 Nossa segurança também se baseia no fato de estarmos aqui para glorificar ao Senhor (Jo 17:10). Com todas as suas imperfeições e deficiências, os discípulos receberam uma palavra de louvor: “Neles, eu sou glorificado”. Por certo, Deus não seria glorificado se um dos seus, que creu no Salvador, não chegasse ao céu. Esse foi o argumento de Moisés quando a nação de Israel pecou: “Por que hão de dizer os egípcios: Com maus intentos os tirou, para matá-los nos montes e para consumi-los da face da terra?” (Êx 32:12). Sem dúvida, Deus conhece todas as coisas, então por que salvar os que ele sabe que vão fracassar ao longo do caminho? Deus termina o que começa (Fp 1:6).

 Deus proveu os recursos divinos para que possamos glorificá-lo e ser fiéis. Temos sua Palavra (Jo 17:7, 8), e ela nos revela tudo o que possuímos em Jesus Cristo. A palavra dá fé e segurança. Temos o Filho de Deus intercedendo por nós (Jo 1 7:9; Rm 8:34; Hb 4:14-16). Uma vez que o Pai sempre responde às orações do Filho (Jo 11:41, 42), este ministério intercessor ajuda a nos manter seguros e protegidos.

 Também temos a comunhão da igreja: “para que eles sejam um, assim como nós” (Jo 17:11). O Novo Testamento não diz coisa alguma sobre cristãos isolados; onde quer que encontrem os cristãos, os vem os em comunhão. Isso porque todos do povo de Deus precisam uns dos outros. Jesus começou sua mensagem no cenáculo lavando os pés dos seus discípulos e lhes ensinado a ministrar uns aos outros. Nas horas subsequentes, esses homens (inclusive Pedro, tão seguro de si!) descobriram como eram fracos e quanto precisavam do encorajamento uns dos outros.

 Assim, os cristãos estão seguros em Cristo por vários motivos: a própria natureza de Deus, a natureza da salvação, a glória de Deus e o ministério intercessor de Cristo. Mas e quanto a Judas? Estaria seguro? Com o veio a cair? Por que Jesus não o guardou? Pelo simples motivo de que Judas nunca pertenceu a Cristo. Jesus guardou fielmente todos os que o Pai lhe deu, mas Judas nunca lhe foi dado pelo Pai. Judas não cria em Jesus Cristo (Jo 6:64-71); não havia sido purificado (Jo 13:11); não estava entre os escolhidos (Jo 13:18); não havia sido entregue a Cristo (Jo 18:8, 9).

 Judas não é, de maneira alguma, um exemplo de cristão que “perdeu a salvação”. Antes, exemplifica um incrédulo que fingiu ser salvo e que, no final, foi desmascarado. Jesus guarda todos os que o Pai lhe dá (Jo 10:26-30).

Somos vencedores, pois compartilhamos de sua vida. Há um terceiro privilégio que nos permite vencer.

 3. TEMOS SUA PALAVRA (JO 1 7 :1 3 -1 9 ) “Eu lhes tenho dado a tua palavra” (Jo 1 7:14, ver também v, 8). A Palavra de Deus é a dádiva de Deus para nós. O Pai deu as palavras ao Filho (Jo 17:8), e o Filho as entregou aos discípulos que, por sua vez, as transmitiram a nós conforme a inspiração do Espírito (2 Tm 3:16; 2 Pe 1:20, 21). A Palavra é de origem divina, é uma dádiva preciosa do céu. Devemos sempre dar à Palavra de Deus o devido valor, pois os cristãos vitoriosos conhecem a Palavra e sabem como usá-la na vida diária.

De que maneira a Palavra de Deus nos permite vencer o mundo? Em primeiro lugar, ela nos dá alegria (Jo 17:13), e essa alegria interior nos dá forças para vencer (Ne 8:10). Costumamos pensar em Jesus Cristo como um “homem de dores” (Is 53:3), o que de fato ele foi; mas também foi uma pessoa de profunda e constante alegria. João 17:13 é o cerne dessa oração, e seu tema é a alegria!

Jesus já havia se referido a sua alegria (Jo 15:11) e explicado que a alegria é decorrente de transformação, não de substituição (Jo 16:20-22). A alegria também vem das orações respondidas (Jo 16:23, 24). Aqui, deixa claro que a Palavra também dá alegria. O cristão não encontra alegria no mundo, mas sim na Palavra. Com o João Batista, devemos nos regozijar grandemente ao ouvir a voz do Noivo (Jo 3:29).

 Não dá para imaginar Jesus andando pela Terra com rosto triste e ar de melancolia. Jesus foi um homem alegre e revelou essa alegria a outros. Sua alegria não era a leviandade passageira do mundo pecaminoso, mas sim o gozo permanente do Pai e da Palavra. Não dependia de circunstâncias exteriores, mas dos recursos espirituais interiores que o mundo não era capaz de ver. É esse tipo de alegria que deseja ver em nossa vida, e só podemos obtê-la pela sua Palavra. “As tuas palavras me foram gozo e alegria para o coração” (Jr 15:16). “Mais me regozijo com o caminho dos teus testemunhos do que com todas as riquezas” (SI 119:14). “Alegro-me nas tuas promessas, com o quem acha grandes despojos” (SI 119:162).

 A Palavra não apenas concede a alegria do Senhor, mas também dá a certeza de seu amor (Jo 17:14). O mundo nos odeia, mas podemos confrontar esse ódio com o amor de Deus, transmitido a nós pelo Espírito por meio da Palavra. O mundo nos odeia porque não pertencem os a seu sistema (Jo 15:18, 19) e nos recusamos a nos conformar com suas práticas e padrões (Rm 12:2). A Palavra revela a verdadeira natureza do mundo e mostra suas ilusões e seus artifícios cheios de perigo.

O mundo deseja tomar o lugar do amor do Pai em nossa vida (1 Jo 2:15-17), mas a Palavra de Deus nos permite desfrutar esse amor. Um dos primeiros passos para uma vida mundana é colocar de lado a Palavra. D. L. Moody escreveu na contracapa de sua Bíblia: “Ou este livro o afastará do pecado ou o pecado o afastará deste livro”. Assim como a coluna de fogo era escuridão para os egípcios, mas luz para Israel, também a Palavra de Deus é luz neste mundo escuro, incapaz de compreender as coisas de Deus (Êx 14:20; 1 Co 2:12-16).

 A Palavra de Deus não apenas traz a alegria e o amor de Deus, mas também transmite o poder de Deus para vivermos em santidade (Jo 1 7:15-1 7). A tônica da oração de Jesus em João 17:6-12 foi a segurança, mas aqui sua ênfase muda para a santidade – uma vida santa prática que glorifica Deus. Estamos no mundo, mas não somos do mundo e não devemos viver como o mundo. Por vezes, achamos que seria mais fácil vivermos fora do mundo, mas isso não é verdade. Para qualquer lugar que vamos, carregamos conosco nosso ser interior pecaminoso e somos seguidos por poderes das trevas. Encontrei gente que se impôs um “isolamento espiritual”, a fim de buscar mais santidade, só para descobrir mais tarde que isso nem sempre funciona.

 A verdadeira santificação (ser separado para Deus) se dá pelo ministério da Palavra de Deus. “Vós já estais limpos pela palavra que vos tenho falado” (Jo 15:3). Ao ser salvos, somos separados para Deus. Ao crescer na fé, experimentamos cada vez mais a santificação. Nosso amor pelo pecado é cada vez menor e nosso amor por Deus é cada vez maior. Desejamos lhe servir e ser bênção a outros. Tudo isso se dá por meio da Palavra.

 A verdade de Deus foi dada em três “edições”; sua Palavra é a verdade (Jo 17:17); seu Filho é a verdade (Jo 14:6); e seu Espírito é a verdade (1 Jo 5:6). Precisamos desses três elementos, a fim de experimentar a verdadeira santificação que toca todas as partes de nosso ser interior. Com a mente, aprendemos a verdade de Deus pela Palavra. Com o coração, amamos a verdade de Deus, seu Filho. Com a volição, nos entregamos ao Espírito e vivemos a verdade de Deus cada dia. É preciso que os três estejam presentes para que a santificação seja equilibrada.

Não basta apenas estudar a Bíblia e aprender uma porção de verdades doutrinárias. Também é preciso amar a Jesus Cristo cada vez mais ao se descobrir tudo o que ele é e tudo o que fez por nós. O aprendizado e o amor devem conduzir à vida prática, permitindo que o Espírito de Deus nos capacite a obedecer à sua Palavra. É assim que glorificamos a Deus neste mundo perverso.

 A Palavra dá alegria, amor e poder para viver em santidade. Também dá o que é preciso para servir a Deus como testemunhas neste mundo (Jo 17:18, 19). A santificação não tem por objetivo o prazer egoísta e a vanglória; antes, serve para que representemos Cristo neste mundo e ganhemos outros para ele. Jesus se separou para nós e, agora, devemos nos separar para ele. O Pai enviou-o ao mundo e, agora, ele nos envia ao mundo. Recebemos ordens e devemos cumpri-las! Jesus encontra-se “separado” no céu, orando por nós, para que nosso testemunho dê frutos, levando muitos ao arrependimento e ao Senhor.

Como ser vencidos pelo mundo quando temos a Palavra de Deus para nos iluminar, capacitar e encorajar?

 4 . COMPARTILHAMOS DE SUA GLÓRIA (Jo 17:20-26) Nesta passagem, Jesus volta nossa atenção para o futuro. Começa a orar por nós, que vivemos hoje, pela Igreja ao longo de todas as eras. Já orou por segurança e por santidade e, agora, enfatiza a unidade. Sua preocupação é que seu povo viva em harmonia espiritual, como o Pai e o Filho são um. Como cristãos, podemos participar de diferentes denominações, mas pertencemos todos ao Senhor e uns aos outros.

 Em várias ocasiões, os discípulos mostraram um espírito de egoísmo, competitividade e desunião e, com isso, devem ter entristecido profundamente o coração do Salvador. Fico imaginando como Jesus se sente quando vê o estado em que a Igreja se encontra hoje. Como escreveu o pregador puritano Thomas Brooks: “A discórdia e a divisão não condizem com cristão algum. Não causa espanto os lobos importunarem as ovelhas, mas uma ovelha afligir outra é contrário à natureza e abominável”.

 Qual é a base para a verdadeira unidade entre os cristãos? A pessoa e a obra de Jesus Cristo e sua glória (Jo 17:2-5). Ele já nos deu sua glória e promete que experimentaremos ainda mais dessa glória quando chegarmos ao céu. Qualquer que seja sua aparência exterior, todos os cristãos sinceros trazem dentro de si a glória de Deus. A harmonia cristã não se baseia nas coisas externas da carne, mas sim nas coisas eternas do Espírito no ser interior. Devemos enxergar além dos elementos do primeiro nascimento – raça, cor, aptidões – e construir a comunhão com base nos elementos essenciais do novo nascimento.

 Já possuímos a glória de Deus dentro de nós (Jo 17:22, ver também Rm 8:29) e, um dia, contemplaremos essa glória no céu (Jo 17:24). À medida que crescemos no Senhor, a glória interior também começa a crescer e a se revelar naquilo que dizemos e fazemos e na forma como falamos e agimos. As pessoas não vêem nosso ser e nos glorificam; vêem e glorificam o ser de Deus (Mt 5:16; 1 C o 6:19, 20).

 Uma das coisas que mais impressionam o mundo é a maneira com o os cristãos amam uns aos outros e vivem em harmonia. É esse testemunho que Jesus deseja no mundo: “para que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17:21). O mundo perdido não é capaz de ver Deus, mas pode ver os cristãos. Aquilo que o mundo enxergar em nós servirá de base para suas convicções acerca de Deus. Se enxergar amor e harmonia, crerá que Deus é amor. Se enxergar ódio e divisão, rejeitará a mensagem do evangelho.

 Jesus garantiu que alguns crerão por causa de nosso testemunho (Jo 17:20), mas devemos testemunhar em verdade e amor. Em lugar de serem testemunhas fiéis, alguns cristãos são advogados de acusação e juízes e, com isso, afastam os pecadores do Salvador.

Os cristãos têm motivos de sobra para amar uns aos outros e para viver em harmonia. Cremos no mesmo Salvador, compartilhamos da mesma glória e, um dia, desfrutaremos o mesmo céu! Pertencemos ao mesmo Pai e desejamos realizar a mesma obra: testemunhar ao mundo perdido que somente Jesus Cristo pode salvar do pecado. Apesar de diferirmos em questões doutrinárias de menor importância, cremos na mesma verdade e seguimos o mesmo exemplo que Jesus deu a seu povo de modo a viver em santidade. Por certo, os cristãos têm suas diferenças, mas temos muito mais coisas em comum, e isso deve servir de estímulo para amarmos uns aos outros e promovermos a unidade espiritual.

Quando preciso falar num funeral, costumo usar João 1 7:24. Com o sabemos que os cristãos vão para o céu? Temos essa certeza por causa do preço que Jesus pagou (1 Ts 5:9, 10), da promessa que Jesus deu (Jo 14:1­ 6) e da oração que Jesus fez (Jo 1 7:24). O Pai sempre responde às orações do Filho, de modo que sabemos que os cristãos que morrem vão para o céu e contemplam a glória de Deus.

 Não encontramos qualquer petição em João 17:25, 26. Jesus simplesmente relatou ao Pai seu ministério aqui no mundo e fez várias declarações importantes para nós. Afirmou que o mundo não conhece o Pai, mas que os cristãos o conhecem, pois o Filho nos revelou o Pai. O mundo certamente tem inúmeras oportunidades de conhecer o Pai, mas prefere continuar a viver com sua cegueira e dureza de coração. Nossa incumbência como cristãos é dar testemunho ao mundo perdido e compartilhar a mensagem salvadora de Deus.

Jesus também declarou a importância da verdade e do amor na Igreja. Os cristãos conhecem o nome (a natureza) de Deus e compartilham dessa natureza divina. Jesus deixou claro que a verdade e o amor devem andar juntos (ver Ef 4:15). Alguém disse bem que a verdade sem amor é brutalidade e o amor sem verdade é hipocrisia. A mente cresce ao receber a verdade, mas o coração cresce ao dar amor. O conhecimento, por si mesmo, leva ao orgulho (1 Co 8:1), mas o amor, por si mesmo, pode levar a decisões erradas (ver Fp 1:9, 10). O amor dos cristãos não deve ser cego! Ao recapitular esta oração, observamos quais eram as prioridades espirituais no coração do Salvador: a glória de Deus, a santidade do povo de Deus; a unidade da Igreja; o ministério de compartilhar o evangelho com o mundo perdido. Fazemos bem em nos concentrar nessas mesmas prioridades. Um dia, cada um de nós prestará contas de seu ministério. É muito sério saber que daremos um “relatório final” diante do trono de Cristo. Espero que possamos dizer: “Eu te glorifiquei na terra, consumando a obra que me confiaste para fazer” (Jo 1 7:4).

Extraído do Comentário de W. Wiersbe

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