POSICIONAMENTO SOBRE AS AÇÕES MISSIONÁRIAS EVANGÉLICAS ENTRE OS POVOS MINORITÁRIOS BRASILEIROS
Em razão do envolvimento missionário evangélico junto aos povos minoritários brasileiros e algumas reportagens publicadas, se faz necessário um posicionamento claro que desmistifique ideias e apresente o que creem e o que fazem os missionários.
A Associação de Missões Transculturais Brasileiras (AMTB) é formada por 78 agências missionárias filiadas, ligadas a alguns milhões de evangélicos. Porém, não representa todos os evangélicos nem todos os missionários evangélicos.
Quanto à cultura tradicional
Respeitamos, apreciamos e valorizamos as culturas, histórias e tradições dos grupos minoritários brasileiros, reconhecendo que nossa preciosa nação é resultado da influência desses e de outros povos, o que faz do Brasil um país único no teor de multiculturalidade e na esperança de uma convivência harmoniosamente exemplar.
Reconhecemos a autonomia dos grupos minoritários quanto às suas tradições e nenhuma ação impositiva deve ser tolerada em relação às mesmas, seja por iniciativa pública ou privada. Em seu Manifesto 2009, a AMTB afirmou, e hoje reafirma, que “nenhum elemento externo jamais deve ser imposto a uma cultura. Toda imposição pressupõe carência de respeito humano e cultural, além de grave erro na construção do diálogo”. Nenhum indivíduo, instituição ou política pública deve forçar quaisquer grupos a mudanças não desejadas em quaisquer áreas da vida.
Entendemos que essa autonomia implica também na liberdade de escolha por manutenção ou mudança em toda a esfera da vida, incluindo, tradições, práticas e crenças. Tal liberdade deve ser igualmente respeitada à luz da Convenção número 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a qual assegura que “os povos indígenas e tribais deverão gozar plenamente dos direitos humanos e liberdades fundamentais sem obstáculos nem discriminação…” (Art. 3 §1). E afirma que “os povos interessados deverão ter o direito de escolher suas próprias prioridades no que diz respeito ao processo de desenvolvimento, na medida em que ele afete as suas vidas, crenças, instituições e bem-estar espiritual…” (Art. 7 §1). Assim, entendemos que a liberdade dos povos, tanto em manter como mudar alguma prática ou crença, deve ser igualmente respeitada.
Quanto à terra tradicional
Apoiamos a reivindicação dos grupos minoritários, e de forma específica dos povos indígenas, por seu direito, garantia e proteção à terra, organização social, costumes, língua e tradição assegurados pela Constituição Federal (Art. 231) e Declaração Universal dos Direi- tos Humanos (Cláusulas XIX e XVII).
Afirmamos também que apenas o direito aos territórios não garante a satisfação de todas as suas necessidades, sendo igualmente importante uma política de cooperação que lhes permita a sobrevivência com dignidade e manifestação dialógica de suas demandas.
Quanto à evangelização
Cremos que o Evangelho é a mensagem de Deus para todos os povos. Cremos também que a evangelização, em uma perspectiva cristã, deve distinguir-se em essência, abordagem e conteúdo da catequese usada pelo Cristianismo na época colonial. A catequese é impositiva, unilateral e coercitiva. A evangelização é expositiva, relacional e participativa e deve ocorrer sempre no ambiente de valorização da língua, cultura e claro desejo da comunidade local.
Defendemos o princípio da autodeterminação dos povos indígenas, como exposto na Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas, aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 13 de setembro de 2007, tendo o Brasil como país signatário; e os diversos posicionamentos da Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA – Organização dos Estados Americanos, todos no mesmo sentido.
Reconhecemos, assim, o direito de servir ao próximo e compartilhar livremente nossa fé e crença de forma voluntária, respeitosa e dialogal, submetendo-nos, como sempre foi, aos parâmetros jurídicos vigentes.
Quanto ao envolvimento social
Mantemos nosso compromisso de cooperação com os grupos minoritários e os povos indígenas do Brasil. Em levantamento realizado em 2010 foram identificados 257 programas sociais coordenados por missionários entre os povos indígenas com recursos das igrejas evangélicas, sem participação de verba pública ou do Estado. Em 2007, as agências missionárias evangélicas promoveram mais de 50.000 atendimentos médicos e odontológicos entre as populações indígenas e entre 2010 e 2012 foram registrados mais de 100.000 atendimentos.
Em dezenas de etnias houve um animador crescimento populacional a partir do envolvi- mento missionário, como os Dâw, Wai-Wai, Nadëb, Jarawara, dentre tantos outros. Cerca de 80 idiomas indígenas foram preservados com a cooperação do trabalho missionário na grafia e promoção de uso da língua, além da produção nos últimos anos de mais de 600 materiais de cunho acadêmico-educacional sobre línguas e culturas indígenas.
Nossa esperança e oração em relação aos povos minoritários brasileiros é por valorização de sua dignidade, convivência pacífica com a sociedade envolvente, garantia de seus direitos em todas as esferas da vida e liberdade de escolha debaixo do critério da autodeterminação.
Brasil, 26 dezembro de 2018
AMTB (Associação de Missões Transculturais Brasileiras)
CONPLEI (Conselho Nacional de Pastores e Líderes Evangélicos Indígenas)
Fonte: APMT