Jarena Lee, Uma Pioneira Negra na Pregação Itinerante

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Jarena Lee. (Foto: Domínio Público)

Jarena Lee foi a primeira a receber reconhecimento oficial das autoridades eclesiásticas como pregadora da Igreja Episcopal Metodista Africana.

Jarena Lee foi a primeira mulher negra a fazer sua autobiografia, autodidata e também a primeira a receber reconhecimento oficial das autoridades eclesiásticas como pregadora da igreja onde congregava, a Igreja Episcopal Metodista Africana. “O Senhor deu a sua serva solitária o poder de falar em seu grande nome, aprisionando os corações do povo e causando um tremor entre a multidão, porque ele estava presente” (ALMEIDA, p. 236, 2020).

Uma mulher cristã que avançou na abertura, Jarena Lee nasceu em 11 de fevereiro de 1783, em Cape May, Nova Jersey, como filha de não escravos. Desde os seus 7 anos de idade, a menina trabalhou como empregada doméstica, a 90 quilômetros de distância.

Quando estava com 21 anos, em 1804, Jarena Lee se converteu após um período de aflições sobre o destino final de sua alma e, três semanas depois, se uniu a uma igreja metodista. Nesse momento, em contato com o reverendo William Scott, mesmo depois de sua conversão, Jarena não ficou convencida de que havia recebido a santificação e suplicou por isso a Deus durante três meses.

O chamado para pregação aconteceu por volta de 1811, depois de sete anos de conversão. Ao revelar seu chamado para a pregação ao reverendo Allen, ministro e fundador da igreja Betel, que lutava pela autonomia de sua igreja do controle do metodismo branco na Filadélfia onde congregava, Jarena teve o exercício de seu dom espiritual gentilmente negado. O rev. Allen não fazia objeções a que as mulheres exortassem ou orassem em suas congregações, mas não permitia a pregação. Essa oportunidade era dada poucas vezes às mulheres.

No ano de 1811, Jarena se casa com o pr. Joseph Lee, da igreja de afrodescendentes em Snow Hill, próximo à Filadélfia. Essa mudança a deixou enfraquecida e desolada, tirando-lhe a vontade de continuar o evangelismo informal em sua casa. Ao longo de seis anos Jarena perdeu cinco membros de sua família, incluindo seu esposo. Ela ficou viúva e com duas crianças pequenas para criar. Contudo, Jarena confiava no amparo de Deus, e contou com a liberalidade de muitos irmãos.

Em 1818, ela retornou a Filadélfia, e entrou em contato novamente com o reverendo Allen, que agora liderava a primeira denominação negra na América, a Igreja Metodista Episcopal Africana. Mais uma vez ela pediu autorização para realizar reuniões de oração em sua casa, e o reverendo lhe concedeu.

Sobre isso, a própria Jarena relatou: “Passaram-se oito anos desde que eu fizera uma petição para que me fosse permitido pregar o Evangelho […] eu só tinha sido autorizada a exortar, e até esse privilégio exerci raramente. Este assunto voltara a minha mente e ardia em meus ossos” (ALMEIDA, p.237, 2020). Ao iniciar essas reuniões a casa dela lotou, e muitas pessoas se rendiam ao Senhor, entregando suas vidas a Jesus. Ela era uma mulher sábia, que buscava intensamente ouvir o que Deus queria que fosse feito.

Em 1819, Jarena deu mais um passo de muita ousadia, ao interromper um sermão e exortar no próprio texto escolhido pelo ministro no púlpito. O texto era Jonas 2.9: “Do Senhor vem a salvação”.

Ela relatou que sentiu um impulso sobrenatural e colocou-se de pé, passando a dar testemunho de que assim como Jonas, ela também tinha sido chamada a pregar o Evangelho oito anos antes, mas que, como ele havia adiado a convocação que recebera. E em seguida afirmou que todos os ouvintes eram tão culpados quanto ao povo de Nínive.

No momento da sua exortação, Deus manifestou grande poder para demonstrar que o chamado de Jarena era verdadeiro. Com medo, Jarena se sentou em seu lugar, e esperava ser excluída da igreja. Mas o reverendo Bispo Richard Allen, se levantou na assembleia e confirmou o que Jarena havia dito, e o fato dele não ter lhe dado autorização para pregar, mas que agora ele acreditava que ela era chamada para esse trabalho tanto quanto qualquer um dos pregadores presentes.

Essa aprovação a fortaleceu muito e lhe trouxe uma serena paz, que nada e nem ninguém poderiam tirar. Em seguida, Jarena iniciou seu ministério de pregadora itinerante, “ela conseguiu pregar da melhor forma pedindo auxílio divino o tempo todo” (ALMEIDA, p.240, 2020). Entre os ouvintes, negros e brancos, ricos e pobres, pessoas sem cultura e pessoas com grande conhecimento.

No início ela encontrou resistência, mas depois teve um bom grau de aceitação no metodismo. A participação das mulheres no crescimento, expansão do Evangelho e abertura de novas igrejas na América, foi fruto do avivamento. A primeira igreja Metodista nos Estados Unidos, em meados do século 17, foi fundada por uma mulher, Barbara Heck. Entre os novos convertidos, a maioria era de mulheres, porém ao estabelecerem a igreja, as mulheres eram silenciadas.

É importante ressaltar que as mulheres recebiam a mesma graça do Espírito Santo, e assim o dom e o chamado para evangelização, pregação e ensino. As mulheres cristãs não estavam engajadas nas causas feministas dos séculos 18, 19, elas queriam trabalhar na evangelização e no ensino, conforme a ordem de Jesus em Mateus 28:19 – “Portanto, ide, ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”.

As pregadoras itinerantes exerciam um papel quase pastoral, nítido no Novo Mundo “[…] no final do século XVIII, as mulheres pregaram e foram de facto “ministros itinerantes”. E isso continuou no século XIX” (ALMEIDA, p.230, 2020). Essa abertura tanto para homens leigos e mulheres era um efeito dos avivamentos, que derrubou restrições no discurso religioso.

Jarena também enfrentou preconceitos e recebeu muitas palavras rudes. Algumas vezes diziam que ela não era uma mulher, mas um homem vestido com roupas femininas. Contudo, ela perseverou no seu trabalho de evangelização, e em 1835 ela viajou sete mil milhas e pregou quase o mesmo número de sermões.

Como mãe, ela teve o privilégio de ter sua oração atendida ao contemplar o dom espiritual de seu filho James, com apenas 6 anos de idade. Em sua autobiografia ela deixou um conselho para os pais: “[…] a promessa do Senhor é: ‘pedi e recebereis’. Queridos pais, orem pelos seus filhos na infância – carreguem-os nos braços da fé ao trono da graça e lá os apresentem como uma oferta ao Senhor” (ALMEIDA, p.241,2020). Mesmo que os seus filhos sejam crescidos não deixem de orar por eles, “Porque para Deus nada é impossível” Lc 1:37.

Sobre a morte de Jarena Lee, não se tem informação. Além de ser mulher, ela sofria preconceitos por ser negra. Mas, mesmo assim, Jarena e outras mulheres prosseguiram, pois tinham convicção que receberam o chamado para pregação e não deixaram de cumprir a ordem de Cristo de pregar o Evangelho a toda criatura. 

Referências:

ALMEIDA, Rute Salviano. Vozes Femininas nos Avivamentos: Europa e Estados Unidos: séculos 18, 19 e início do século 20. Viçosa, Ultimato, 2020.

LEE, Jarena. Oxford Reference, Pregador itinerante e autobiográfico (1783), visão geral. Disponível em:<https://www.oxfordreference.com/display/10.1093/oi/authority.20110803100057378> Acesso em: 17 jan. 2024.

LEE, Jarena. Religious experience and jornal of Mrs. Jarena Lee: giving na account of her call to preach the gospel. Umilta. P.18. Disponível em: <http://www.umilta.net/jarena.html>. Acesso em 17 jan. 2024.

Caroline Fontes é bacharel em Teologia com pós em Ciência da Religião; formada em Pedagogia pela UERJ e pós-graduação em Neuropsicopedagogia – FAMEESP. Mora no Rio de Janeiro, é casada com o Pr. Ediudson Fontes, mamãe de Calebe Fontes.

FONTE: GUIAME, CAROLINE FONTES

RETIRO IP SEMEAR 2023

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